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de Energia Elétrica e Gás no Estado de Mato Grosso

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Déficit em horário de pico entra no radar do governo

Déficit em horário de pico entra no radar do governo

Em: 28/09/2015 às 14:50h por

As simulações oficiais indicam que o risco de um racionamento de energia fica perto de zero ao longo dos próximos dez anos, mas uma nova preocupação surge no horizonte. Em estudo recém-divulgado, o governo identifica possibilidades cada vez maiores de déficit no atendimento dos horários de ponta, que se tornam preocupantes no futuro.
Em 2024, último ano para o qual são feitas projeções, as chances de a produção do sistema interligado não dar conta dos picos de demanda ultrapassam 35%. O risco está relacionado à proliferação de hidrelétricas na região amazônica. Sem grandes reservatórios, essas usinas a fio d'água geram um volume enorme de energia durante o período de chuvas, mas reduzem significativamente a produção de megawatts nos meses de estiagem.
Atualmente, o maior desafio na operação do sistema ocorre no verão, quando as altas temperaturas fazem consumidores de todo o país ligar seus aparelhos de ar-condicionado a plena potência. É tipicamente um problema de demanda. Tem aparecido nas tardes de janeiro e fevereiro. A partir de 2019, o drama migra para o período de outubro a dezembro. Passa a ser um problema basicamente de oferta. Nessa época do ano, a produção de energia das usinas amazônicas será inevitavelmente baixa, pois seus reservatórios não guardam volume de água suficiente para atravessar toda a estiagem.
A mudança do perfil da geração hidrelétrica pode ser verificada pela capacidade de armazenamento das represas do sistema interligado nacional. Em 2001, se parasse completamente de chover e os reservatórios estivessem cheios até a borda, eles seriam capazes de atender à demanda por pouco mais de seis meses, sem o reforço de nenhuma térmica. Hoje, durariam cerca de quatro meses. Daqui a dez anos, o estoque seria consumido em três meses.
De acordo com o novo Plano Decenal de Energia (PDE), que guia o planejamento do setor no período 2015-2024 e está em consulta pública, o déficit para atender os horários de pico pode chegar a quase 11 mil MW de potência no segundo semestre de 2024 - praticamente a capacidade instalada da usina de Belo Monte.
"Precisamos buscar soluções para o atendimento futuro da demanda de ponta", afirma o secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Luiz Eduardo Barata, reconhecendo a necessidade de pensar em estratégias para lidar com essa situação. Segundo ele, o ministério começa a estudar "soluções mais sofisticadas" para o problema, como a retomada de usinas reversíveis no país.
O risco está relacionado à proliferação de hidrelétricas na região amazônica, que são usinas a fio d'água
Esse tipo de usina prevê a existência de dois reservatórios no mesmo empreendimento. A represa de baixo vai guardando a água turbinada e pode bombeá-la ao lago superior durante períodos de baixa demanda de energia, geralmente de madrugada, recompondo o armazenamento para gerar eletricidade novamente em horários de maior demanda.
Barata lembra que a usina de Pedreira, da Empresa Metropolitana de Águas e Energia (Emae), foi a primeira do mundo a adotar essa tecnologia - em 1939. "Não implementamos outras porque começamos a construir reservatórios", explica. Agora, o ministério volta a mapear onde essas hidrelétricas poderiam ser construídas.
Para o diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), Hermes Chipp, a vantagem é que existe tempo suficiente para pensar em soluções, mas o problema do atendimento de ponta tende mesmo a se intensificar com o início do funcionamento de megaprojetos amazônicos.
"A operação do sistema vai ficar cada vez mais complexa", diz Chipp, apontando a dificuldade de lidar com a combinação de alta demanda e reservatórios com baixa capacidade de armazenamento. Ele sugere o uso de mais térmicas para enfrentar o período seco.
A economista Joísa Campanher Dutra, professora da FGV-RJ e ex-diretora da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), minimiza as dificuldades apontadas pelo plano decenal para o pico de demanda. Ela nota que as previsões de crescimento do PIB nos próximos anos estão superestimadas pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Com isso, o risco de déficit no atendimento dos horários de ponta não deve ser tão grave como o imaginado.
Mesmo assim, Joísa aponta a necessidade de aperfeiçoar o gerenciamento da demanda, em vez de se olhar só para a oferta. Um dos mecanismos já pensados pela Aneel para lidar com essa questão é a "tarifa branca", que ofereceria descontos aos consumidores fora dos horários de pico, tal como ocorre nas ligações telefônicas de longa distância. A ideia, porém, nunca foi implementada. Os medidores inteligentes, capazes de fazer essa leitura do consumo por faixas de horário, não foram instalados pelas distribuidoras porque o Inmetro jamais certificou os equipamentos para instalação. (O Estado de S. Paulo)