A situação conjuntural do setor elétrico, em que reservatórios estão com o nível de armazenamento fora do ideal e as térmicas estão ligas a todo vapor – reacendeu a discussão sobre quem deve pagar a conta das termelétricas fora da ordem de mérito (mais caras), que estão sendo acionadas pelo Operador Nacional (ONS) em sua plenitude desde outubro de 2012. A atual regulação repassa esse custo aos consumidores de forma diferente: os livres pagam imediatamente na liquidação do mês; enquanto os cativos pagam por meio das tarifas, assim que ocorrem os reajustes das distribuidoras, às vezes, com um gap de um ano.
O fato é que ninguém quer que falte energia. Mas essa conta adicional, que pode ultrapassar R$500 milhões por mês atualmente, gera discussões no setor e afetam diretamente e, principalmente, os agentes que estão “descobertos” e precisam comprar energia no curto prazo, com base no Preço de Liquidação das Diferenças (PLD), que também anda bem alto, flutuando entre R$200 e R$400 por MWh.
Uns defendem que essa conta seja paga pelos geradores hidrelétricos, afinal, as térmicas estão sendo acionadas para compensar os baixos níveis de reservatórios. É o caso do diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Edvaldo Santana. Para ele, o custo térmico fora da ordem de mérito deveria repassado aos geradores. A medida, em tese, beneficiária o consumidor.
No entanto, para a Associação Brasileira das Empresas Geradoras de Energia Elétrica (Abrage), os geradores hidrelétricos já contribuem para a modicidade tarifária, vendo energia barata durante boa parte do ano e não deveriam pagar essa conta.
“As usinas termelétricas não são backup de usinas hidrelétricas, pois foram contratadas nos leilões para atender a uma parcela definida do mercado e fazem parte estrutural da oferta de energia elétrica planejada pelo governo. Assim, o despacho das usinas termelétricas por mérito ou fora de mérito não elimina o caráter estrutural das mesmas. Ao ser despachada pelo mérito ou fora dele e atender à sua fração do mercado, a termelétrica não substitui a hidrelétrica, e sim suspende a substituição que a UHE vinha realizando”, argumenta a Abrage.
A associação lembra ainda que em 2012, “as hidrelétricas ofertaram energia secundária com preços baixos no início do período. Posteriormente, em especial a partir do segundo semestre, o deplecionamento foi intensificado, ao mesmo tempo em que foram acionadas usinas termelétricas pelo POCP [Procedimento Operativo de Curto Prazo]. Nesse processo, essa parcela adicional de geração termelétrica para segurança energética deslocou a geração hidrelétrica além do que seria esperado pelo critério do mérito econômico, sendo o maior percentual dos custos (até o limite do PLD) suportado pelos próprios agentes geradores hidrelétricos do MRE [Mecanismo de Realocação de Energia].
Na sequência, em especial a partir do final de outubro de 2012, com os reservatórios ainda mais deplecionados (pelo efeito acumulado da não geração das usinas termelétricas em montantes equivalentes aos seus contratos ao longo do ano), o GSF passou a “penalizar” ainda mais os participantes do MRE, segundo a Abrage.
“Então, não é correto afirmar que as hidrelétricas não participam do custo de geração de segurança, pois, até o valor do PLD, todo o montante de geração das demais fontes afeta consideravelmente a contabilização dos resultados das usinas hidrelétricas do MRE”, defende a associação.
Para ilustrar, na contabilização realizada pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) referente ao mês de novembro de 2012, os agentes hidrelétricos que compõem o MRE tiveram uma exposição de quase 10% ao PLD médio de cerca de R$375/MWh, o que representa um custo de R$ 1,2 bilhão em apenas um mês operativo.
“Entendemos que esse custo faz parte do risco do negócio da geração e não seria adequado exportá-lo aos demais agentes do SIN [Sistema Elétrico Nacional], da mesma forma que não é adequado alocar aos geradores os custos de geração termelétrica de responsabilidade da carga. Entretanto, esse custo, de grande magnitude, evidencia que os geradores hidrelétricos já participam do custeio das termelétricas e são bastante prejudicados em situações de baixas afluências”, disse a Abrage.
“Seja pela doutrina do “causador-pagador”, seja pela do “beneficiário-pagador”, o gerador hidrelétrico não se enquadraria como participante do rateio do custeio do despacho das térmicas fora da ordem de mérito. Finalmente, a Abrage entende que a reabertura desta questão aumentaria a insegurança regulatória percebida pelos geradores nesse momento, os quais não contemplaram em suas concessões essa possibilidade de participação no custeio das usinas termelétricas, com graves consequências no equilíbrio econômico-financeiro das empresas”, concluiu, em carta enviada ao Jornal da Energia.