Até o fim da década, a geração de energia elétrica pela indústria de celulose poderá chegar a 20 mil gigawattshora (GWh) por ano, o dobro da capacidade de cogeração atual. Nesse cenário, os produtores brasileiros da fibra terão excedente total de energia para venda à rede externa da ordem de 6,5 mil GWh/ano, o suficiente para atender à demanda de uma cidade com 2,5 milhões de habitantes, segundo estudo da finlandesa Pöyry, que atua na área de consultoria e serviços de engenharia e é tradicional fornecedora da indústria globalmente.
“À medida que cresce o tamanho das fábricas aumenta também a oportunidade em energia, porque é maior o potencial de cogeração”, explicou ao Valor o vicepresidente da Pöyry, Carlos Farinha e Silva. Conforme o especialista, uma linha com capacidade produtiva de 1,5 milhão de toneladas anuais de celulose pode gerar até 270 MW, ou 2.300 GWh por ano, com excedente de 1.200 GWh por ano para comercialização.
Atualmente, as maiores e mais modernas linhas de celulose em operação no mundo, que têm justamente esse tamanho, estão instaladas no Brasil e pertencem à Eldorado Brasil e à Suzano Papel e Celulose. O estudo da Pöyry mostra que a capacidade de geração de energia elétrica das indústrias brasileiras de papel e celulose é de 10 mil GWh/ano hoje em dia. Com a entrada em operação de seis novos projetos da CMPC Celulose Riograndense (expansão de Guaíba), Fibria (Três Lagoas II), Eldorado (Três Lagoas II), Lwarcel (expansão) e da CRPE Holding (nova fábrica) , a capacidade de cogeração dobraria, para 20 mil GWh.
Assumindose um excedente de 15% na geração atual e de 50% da geração adicional futura, aponta a consultoria, haveria um excedente de 6,5 mil GWh ao ano que poderia se converter em receita ao setor de celulose. Um dos obstáculos da indústria, todavia, é o limite para venda subsidiada de energia à rede, de 30 MW, que acaba desestimulando mais investimentos em cogeração. “Há uma grande incerteza quando ao desenvolvimento da situação [energética] no Brasil, que é muito dependente da geração hídrica”, afirmou o vicepresidente da Pöyry. Ao mesmo tempo, ressalta, a biomassa ainda é subutilizada.
“E ela vem como um subproduto da produção de celulose, o que é o melhor dos mundos”, ressaltou. A grande “usina” de energia das produtoras de celulose é a caldeira de recuperação química, cujo tamanho acompanhou o ganho de escala das linhas produtivas da fibra. É na caldeira de recuperação que é gerado o vapor de alta pressão que, além de ser usado no processo produtivo como energia térmica, aciona turbinas acopladas a geradores de energia.
Esse vapor resulta da queima do licor negro, um subproduto da produção de celulose, na caldeira de recuperação. Outra fonte de energia é a queima de resíduos gerados no transporte, na picagem e peneiragem da madeira na caldeira de biomassa, que gera vapor e alimenta turbogeradores. Além disso, o resíduo gerado no descascamento da madeira, galhos e pontas resultantes do corte da floresta pode ser usado como biomassa, explicou Yves Gerschkovitch, responsável pela área de geração de vapor e energia da Pöyry.
“A fábrica de celulose já é intrinsecamente uma termelétrica”, afirmou. Para indústrias mais antigas e com elevado custo de produção, o negócio de energia renovável já se mostrou mais rentável do que a própria produção de celulose. Em setembro do ano passado, por exemplo, a espanhola Ence, uma das maiores produtoras de fibra de eucalipto da Europa, anunciou o encerramento da produção de celulose na fábrica de Huelva (Andaluzia), com transformação da unidade em “um avanço centro de geração de energia renovável”. (Valor)