Em: 28/10/2014 às 15:52h por Ivo Pugnaloni/Abrapch

“Em lugar de ampliar divergências, creio que é hora de construção de pontes. O calor liberado no fragor da disputa pode ser transformado em energia construtiva de um novo momento no Brasil. Em alguns momentos da história, resultados apertados produziram mudanças mais rápidas e mais amplas. Essa é minha esperança. Aliás, é minha certeza. Esta presidenta aqui está disposta ao diálogo e este é meu primeiro compromisso neste segundo mandato. Toda eleição é uma forma de mudança. Principalmente para nós, que vivemos numa das maiores democracias do mundo.”

Com estas palavras, a presidenta Dilma Rousseff, reeleita, abriu seu discurso da vitória. Por essa razão, por acreditarmos no diálogo proposto, nós que representamos aqueles que elaboraram mais de 9.400 MW de projetos de pequenas hidrelétricas que estão parados dentro da ANEEL e da EPE há mais de oito anos e toda a cadeia produtiva de fabricantes, construtoras, projetistas e acadêmicos do setor estaremos protocolando ainda hoje nosso pedido formal de audiência com a mandatária do período 2015 a 2018.

Apostaremos mais uma vez no diálogo, para voltar a fazer o Brasil crescer com a energia limpa e barata das hidrelétricas. E não com as caríssimas e poluentes termoelétricas movidas a combustíveis fósseis, ligadas a todo vapor, por culpa também daqueles que se intitulam ambientalistas, protestam contra hidrelétricas, mas que estranhamente, não se importam nem um pouco com o aumento de mais de 63% na emissão de gases de efeito estufa e dos particulados, do enxofre, devido aos combustíveis fósseis gastos com a produção de energia elétrica de origem fóssil, apenas nos últimos dois anos.

Concordamos com a presidente de que o clamor por mudanças foi o maior recado das urnas, mas se mudanças precisam ser feitas em muitos setores da vida publica, como é o caso da reforma política e do combate à corrupção, dentro do governo federal é no setor energético e principalmente no setor elétrico que estão os maiores entraves ao crescimento harmônico e equilibrado do Brasil. E dizemos isso por várias razões. Todas do maior interesse público.

Em primeiro lugar é importante mudar porque muitos dirigentes do setor elétrico brasileiro, alegando “terem que, acima de tudo, evitar o apagão”, terem passado a hostilizar, dificultar e mesmo impedir a construção de novas hidrelétricas. Com exceção é claro, daquelas que fossem construídas no meio da Amazônia, daquelas que tivessem grande porte, exigissem extensas linhas de transmissão, gerassem orçamentos multibilionários e sempre crescentes e fossem construídas por gigantescos grupos econômicos, como se não precisassem do investimento de grupos menores, pequenos e médios. Enormes usinas, que de forma muito estranha, não contam com reservatórios plurianuais em seus projetos de engenharia. O que nos tornará dependentes, nos períodos secos do ano, de novos e crescentes gastos com energia termelétrica.

Em segundo lugar é importante fazer mudanças no setor elétrico porque foi o setor elétrico e não o ministério da fazenda, o grande responsável pelo desequilíbrio das contas públicas, devido ao prejuízo de mais de 75 bilhões de reais na balança comercial brasileira. Um prejuízo que nenhum setor jamais provocou sozinho e causado pelo aumento da conta de importação de derivados de petróleo para sustentar a geração termoelétrica com a justificativa de evitar um apagão que poderia ter sido evitado de formas muito menos nocivas à economia e ao meio ambiente se o setor elétrico tivesse se dedicado mais e melhor ao aproveitamento do potencial hidráulico do Brasil.

Num efeito cascata, foi esse desequilíbrio que afetou todas as contas públicas, elevou a inflação, retirou recursos preciosos da economia e remeteu-os diretamente às concorrentes da Petrobrás no exterior, simplesmente por que não conseguiu, ou melhor, não permitiu que construíssemos hidrelétricas de menor porte no mesmo ritmo do crescimento do consumo.

Essa solução foi, sob todos os aspectos, desastrosa e graças a ela foi necessário aumentar novamente, em 35% as tarifas que haviam diminuido em 28% em 2013, por conta do fim da amortização das hidrelétricas construídas há mais de 30 ou 40 anos em uma decisão que havia nos tirado do quarto lugar da energia mais cara do mundo, levando-nos para o décimo segundo. Essa solução simplista, de gastar cada vez mais petróleo para afastar a hipótese de um apagão que poderia ter sido evitado de outras formas, com mais trabalho, mais planejamento, mais atenção às características do sistema elétrico brasileiro e com menos “cópia” de modelos importados, impediu nossos produtos de continuarem competindo no mercado internacional, fez cair nossa produção industrial, gerando prejuízos e perda de novos contratos.

Se não houver mudanças e mantidas as atuais diretrizes, voltaremos novamente a ostentar a maior tarifa do continente americano e a quarta mais cara do mundo. Posição que poderá subir mais ainda, se a economia voltar a crescer como todos nós esperamos.

Em terceiro lugar é preciso mudar muito no setor elétrico por que, embora tenha um orçamento fabuloso para a comunicação social, o setor elétrico brasileiro perde “de goleada” a batalha de comunicação que é promovida por organizações estrangeiras que atuam contra o aproveitamento do enorme potencial hídrico brasileiro, tanto para gerar energia como para prover de água potável as maiores cidades do país.

Sobre esse aspecto, salta aos olhos que, para defender Belo Monte, alguns estudantes da Universidade de Brasília tivessem que produzir um vídeo amador para desmentir uma superprodução estrelada por astros e estrelas globais, recheada de mentiras que o MME deixou sem resposta, no melhor estilo “quem cala consente”.

Como é possível que organizações quase amadoras, com orçamentos relativamente pequenos, vencessem a determinação governamental da sexta economia do mundo em construir novas hidrelétricas completamente dentro de todos os parâmetros internacionais de proteção à flora, à fauna e aos direitos dos povos originários? Ou teria havido “corpo mole”, “sapato alto” e faltado ao nosso “time”, acima de tudo, vontade de vencer essa partida?

Será que as posições geopolíticas estrangeiras prosperaram dentro de nosso próprio campo de defesa e agora, até nossos técnicos, já estariam realmente convencidos de que “hidroelétricas agridem o meio ambiente”?

Ou será que todos teríamos nos esquecido que de nada adianta ter eólicas no período de ventos se não existirem hidrelétricas para gerar no período de chuvas? Ou será que nossos técnicos acham que estamos condenados a depender de termoelétricas fósseis até nesse período?

Ou será que fomos todos acometidos de um temor reverencial pelo fato de que os recursos que alimentam essas organizações que combatem hidroelétricas no Brasil são fornecidos por governos estrangeiros?

Segundo relatórios da ABIN, a agência brasileira de inteligência, disponíveis na internet, é de lá dos países que sediam as grandes petroleiras do mundo, que fornecem cada vez mais derivados de petróleo que usamos para gerar energia com termelétricas, a custos seis vezes mais caros do que nossas pequenas hidrelétricas, que provem a grande maioria do dinheiro que faz funcionar essa campanha midiática que está nas primeiras páginas dos jornais brasileiros, coletando assinaturas para “salvar nossas florestas do perigo das hidrelétricas”.

Acreditando no diálogo franco e direto, se formos recebidos desta vez, vamos levar à presidenta nossas propostas, há anos ignoradas por membros de seu governo que desprezaram como se nenhuma contribuição pudessem dar, nada menos do que 9.400 MW de novas hidrelétricas com alagamento menor do que 15 campos de futebol cada uma.

De forma a permitir um melhor resultado em nossa audiência, deixamos duas questões para que a presidenta apresente aos atuais formuladores de sua política energética.

A primeira: qual teria sido a norma técnica ambiental, emitida por órgão licenciador estadual federal ou estadual que teria exigido da EPE e do MME que projetassem apenas novas usinas com esse estranho e economicamente inviável formato de “usina sem reservatório”?

E a segunda: existiriam provas de que, graças à falta de reservatórios, a construção dessas usinas teria sido “mais tolerada” pelas organizações e pelos governos estrangeiros que as sustentam, ou será que esses setores continuaram combatendo nossas hidrelétricas da mesma forma como fariam se elas tivessem reservatórios normais, coerentes com sua finalidade estratégica? Nosso setor já investiu 1 bilhão de reais no licenciamento ambiental e em projetos de engenharia de 800 pequenas hidrelétricas que se encontram parados na ANEEL e na EPE. Esse total corresponde a 65% de uma nova Itaipu e pode produzir efeitos extremamente favoráveis ao abastecimento de água, à conservação ambiental, à contenção da erosão, à proteção das margens dos rios e à irrigação. Ao mesmo tempo, o Brasil não pode mais continuar subordinado a diretrizes que vem do exterior para poder gerar a energia elétrica e água potável que permitam a sobrevivência saudável da sua população, das suas indústrias e o crescimento econômico e social. Por isso, para acabar com essa dependência, esperamos ser compreendidos quando dizemos que as mudanças no setor elétrico são tão fundamentais.