Sindicato da Construção, Geração, Transmissão e Distribuição

de Energia Elétrica e Gás no Estado de Mato Grosso

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Raphael Gomes, advogado: Alterações no setor elétrico decorrentes da lei 13.360/2016

Raphael Gomes, advogado: Alterações no setor elétrico decorrentes da l

Em: 05/12/2016 às 14:07h por

Em 18.11.2016, foi publicada a Lei nº 13.360/2016, que é a Lei de Conversão da Medida Provisória nº 735/2016 (“Lei 13.360”).

A versão original da MP tinha escopo definido (gestão da CDE e RGR e privatização de empresas estatais). Após intensa movimentação política, a MP 735 quadruplicou de tamanho e passou a tratar dos mais diversos temas.

A Lei 13.360 nasce sem um objeto definido, inaugurando algumas regras positivas e outras polêmicas, mas que talvez não tenham tido a discussão necessária em razão do acúmulo de matérias em um mesmo texto normativo.

Fato é que importantes e profundas alterações no Setor Elétrico foram instituídas, e devem agora ser estudadas.

I. ATRIBUIÇÃO, GESTÃO E DESTINAÇÃO DA CONTA DE DESENVOLVIMENTO ENERGÉTICO (CDE)

A Lei 13.360 trouxe inovações em relação à destinação da CDE, definindo, entre outros, que o encargo passa a compensar os descontos dos custos de transmissão e distribuição e o impacto tarifário de reduzida densidade de carga das cooperativas de eletrificação rural, concessionárias e permissionárias, em relação à concessionária de distribuição supridora, isentando o consumidor beneficiado pela Tarifa Social de Energia Elétrica do pagamento das quotas anuais da CDE.

Adicionalmente, a nova Lei inclui a CDE e da Conta de Consumo de Combustíveis (CCC), a partir de 01.05.2017, como atribuição da CCEE, devendo as receitas, despesas e os beneficiários da CDE ser publicados mensalmente, o que é um avanço em relação à transparência e publicidade na utilização desse encargo.

II. ALTERAÇÕES NO MECANISMO DE REALOCAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA (MRE)

Duas foram as mudanças mais relevantes:

(i) a proibição de exclusão, do Mecanismo, de Usinas não despachadas centralizadamente, exceto nas hipóteses de solicitação ou perda da outorga; e

(ii) a alteração da responsabilidade pelo pagamento do custo de deslocamento da geração hidrelétrica decorrente de (ii.1) geração termelétrica acima daquela determinada por ordem de mérito; e (ii.2) importação de energia elétrica sem garantia física.

Enquanto que a primeira alteração objetivou uma isonomia entre geradores despachados ou não centralizadamente pelo ONS, a segunda visou desonerar o gerador quanto aos custos decorrentes da diminuição do despacho hidráulico por motivos que não lhes são gerenciáveis, o que era um pleito antigo dessa categoria.

III. ALTERAÇÃO NA QUESTÃO DO RECONHECIMENTO EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE

Um dos temas mais polêmicos constantes da novel legislação.

Em 2015, o art. 4º da Lei nº 13.203 trouxe a primeira inovação sobre a matéria: retirou da ANEEL a atribuição para julgar casos relativos às excludentes de responsabilidade, bem como eventual alteração no prazo de outorga dos empreendimentos envolvidos, passando tal competência para o MME.

Ao arrepio das melhores técnicas legislativas e em afronta clara aos Princípios da Motivação, Publicidade e Razoabilidade, meses após a publicação da Lei nº 13.203/2015, sobreveio a MP 735/2016 que, no último inciso de seu penúltimo artigo, revogou o citado artigo 4º da Lei nº 13.203/2015.

Além de a matéria não ter qualquer correlação com o tema tratado pela mencionada MP, a revogação do artigo criou um vácuo legislativo. A competência da ANEEL foi repristinada? Qual o tratamento para os procedimentos de em trâmite?

Sem que houvesse resposta a qualquer desses questionamentos, a Lei prescreve, em suma, que: a atribuição para analisar e julgar os pedidos de excludente de responsabilidade volta a ser da ANEEL; a ANEEL, caso reconheça a excludente, deverá recompor o prazo de outorga, compatibilizando-o com o atraso ocorrido na obra; e pela primeira vez, de maneira clara e exemplificativa, são expostos os fatos que devem ser entendidos como excludentes de responsabilidade.

Ao indicar tais fatos a serem reconhecidos como excludentes, possibilita-se maior previsibilidade e segurança jurídica em relação às decisões da ANEEL a respeito do tema.

Uma crítica bastante recorrente no Mercado é a falta de critérios mais objetivos e, até mesmo, certa incoerência nas decisões administrativas da ANEEL no que se refere aos processos que envolvem o reconhecimento de excludentes de responsabilidade. Espera-se, portanto, que a Lei venha a contribuir positivamente para reverter esse cenário de insegurança jurídica.

IV. VENDA DE ENERGIA PELAS DISTRIBUIDORAS NO ACL

A Lei 13.360 criou a possibilidade de venda de excedentes contratuais pelas Distribuidoras no Ambiente de Contratação Livre.

Assim, as Distribuidoras poderão celebrar contratos livremente negociados com consumidores livres, desde que tais contratos estejam “lastreados no excesso de energia contratada para atendimento à totalidade do mercado”, o que é uma ruptura conceitual significativa.

A ANEEL deverá atentar, quando da regulação da matéria, para diversos aspectos de grande relevância, como:

• Critérios para definição do “excesso de energia”. O que será considerada fato superveniente ou falhas de eficiência da Distribuidora?

• A venda do excesso de energia elétrica será ex post, ou poderão as Distribuidoras celebrar contratos de venda de longo prazo?

• Ficando a Distribuidora com balanço energético negativo após a venda, qual será o tratamento?

• Eventuais ganhos financeiros das negociações no ACL serão alocados para as Distribuidoras, incentivando práticas mais eficientes ou serão alocados para o Consumidor?

As respostas exigem Análise de Impacto Regulatório - AIR detalhada e amplo debate a sociedade para que todas as vertentes sejam avaliadas e a “solução” legal não venha a se tornar mais um problema para o Setor.

V. ALTERAÇÃO NO REGIME DAS OUTORGAS NO SETOR ELÉTRICO

Foram revistas condições de renovação e requisitos para enquadramento na condição de concessionário ou autorizatário de serviços e instalações de energia elétrica. Vejamos os pontos mais relevantes.

• A renovação das outorgas de empreendimentos hidráulicos entre 5MW e 50MW poderão ser prorrogadas, uma única vez, mas agora a título oneroso;

• O regime de Concessão, mediante licitação, era destinado para aproveitamentos hidráulicos e termelétricos, de potência superior a 3MW e 5MW, respectivamente, desde que destinados à execução de serviço público. Agora, a potência instalada aumenta para 50MW, tanto para hidráulicas quanto térmicas;

• Para usinas hidrelétricas, destinadas à produção independente, será obrigatória a forma de concessão para empreendimentos com potência superior a 50MW (antes era 10MW). Para empreendimentos hidrelétricos destinados à autoprodução vale a mesma regra, sendo que, nesse caso, o regime será o de Concessão de Uso de Bem Público; e

• O limite de potência para o Detentor de Registro, tanto para usinas hidrelétricas quanto termelétricas, passa a ser de 5MW.

Em relação à extinção das outorgas, o concessionário, permissionário ou autorizado de serviços e instalações de energia elétrica poderá apresentar plano de transferência do controle societário como forma de evitar a extinção da concessão.

VI. DAS REGRAS RELATIVAS À LICITAÇÃO DE EMPRESAS SOB CONTROLE DIRETO OU INDIRETO DA UNIÃO

Seguindo diretriz existente desde o texto original da MP nº 735/2016, a Lei 13.360 trouxe diversas regras objetivando viabilizar a licitação de empresas sob controle direto ou indireto da União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

Dentre tais regras, inclui-se a possibilidade de a União promover licitação associada à transferência do controle societário da concessionária, outorgando novo contrato de concessão pelo prazo de 30 anos.

VII. DOS LEILÕES DE ENERGIA NO ACR

Em relação aos Leilões de energia promovidos pela ANEEL no Ambiente de Contratação Regulada, a Lei 13.360 trouxe algumas inovações sobre o tema.

• Quanto à energia existente, a entrega passa de 2 para até 5 anos após a realização do Leilão;

• Os prazos para entrada em operação comercial nos Leilões de energia nova, que eram de 3 ou 5 anos, passam a ser entre 3 e 7 anos; e

• “Empreendimentos de energia nova” passa a ser aquele que não tenham entrado em operação comercial na data da realização do Leilão, enquanto que a regra anterior enquadrava nessa categoria Usinas em operação comercial há menos de 1 ano da data do certame.

Considerando a relevância e abrangência das alterações normativas inauguradas pela Lei nº 13.360/2016, é imprescindível o estudo de sua abrangência e impactos globais da norma.

Raphael Gomes é especialista em energia do Demarest Advogados