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Com apoio do governo, Senado votará se linha de energia pode passar em área indígena

Em: 03/05/2022 às 09:17h por O Globo

Por Camila Zarur — Brasília

 


Linhão de Tucuruí passa sobre o Rio Amazonas  — Foto: Leo Caldas/Valor

Linhão de Tucuruí passa sobre o Rio Amazonas — Foto: Leo Caldas/Valor



O Senado deve votar hoje um projeto que autoriza a passagem de linhas de transmissão de energia elétrica por terras indígenas. De autoria do senador Chico Rodrigues (União Brasil-RR), a proposta busca destravar casos como o do Linhão de Tucuruí, que ligará Roraima ao Sistema Nacional de Energia, mas que passa por dentro da Terra Indígena Waimiri-Atroari.

 

O projeto classifica as linhas de transmissão como “relevante interesse público da União”. Dessa forma, a sua instalação em terras indígenas passaria a ser permitida. Isso porque a Constituição prevê que o uso dessas áreas reservadas só é autorizado se houver interesse público do país, desde que as comunidades afetadas sejam ouvidas.

Defendido pelo governo de Jair Bolsonaro (PL), o leilão para a construção do Linhão foi feito em 2011, ainda durante o primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff (PT). A obra, porém, não foi levada adiante. A responsável pelo empreendimento é a concessionária Transnorte Energia.

A justificativa para o empreendimento é o isolamento de Roraima do Sistema Nacional de Energia. Hoje, o estado depende do fornecimento de energia da Venezuela, que é intermitente e que sofre com apagões frequentes.

 

Para ligar Roraima ao fornecimento de energia nacional, é necessário construir o chamado Linhão de Tucuruí, uma linha de transmissão com 250 torres e extensão de 715 km. O percurso vai de Manaus, no Amazonas, até Boa Vista, capital roraimense. Para isso, porém, é preciso atravessar 122 km da Terra Indígena Waimiri-Atroari, onde vivem 2,6 mil indígenas — entre eles, há a presença de povos isolados.

De acordo com o Conselho Indígena de Roraima (CIR), as comunidades da área reservada não foram ouvidas para a construção do Linhão de Tucuruí. A entidade argumenta que não consultar os indígenas que vivem na terra que será impactada fere a Constituição e a Convenção 169 da Organização Internacional de Trabalho (OIT).

A convenção prevê que, “antes de se empreender ou autorizar qualquer programa de prospecção ou exploração dos recursos existentes nas suas terras”, os governos devem consultar as comunidades afetadas “a fim de se determinar se os interesses desses povos seriam prejudicados, e em que medida”.

— As comunidades devem participar do debate para discutir as medidas de compensação, mitigação e indenização dos impactos, alguns deles irreversíveis —, diz Ivo Cípio Aureliano, assessor jurídico do CIR.

Entre os impactos causados pela construção do linhão, Aureliano cita a restrição do uso da terra — de acordo com o advogado, cada torre de alta voltagem ocuparia uma área de 50m² —, o que dificultaria atividades como a pesca e caça, essenciais paras as comunidades da região.

No ano passado, o governo Bolsonaro conseguiu o aval da Funai e do Ibama para levar a obra adiante. O empreendimento, porém, enfrenta questionamentos na Justiça. Em um dos processos, a Justiça Federal do Amazonas condicionou a obra ao pagamento de R$ 133 milhões ao povo Waimiri Atroari como compensação pelo impacto.

A decisão foi emitida em dezembro do ano passado, mas foi anulada em fevereiro devido a um outro processo que ainda aguarda julgamento.

 

Mudanças do relator

 

Para conseguir a aprovação do projeto, o relator da proposta no Senado, Vanderlan Cardoso (PSD-GO), pediu mudanças no texto para deixar mais clara a necessidade de ouvir as comunidades afetadas e garantir a indenização pelos impactos. Na nova redação, a projeto prevê que a implementação do empreendimento só poderá ser feita após a consulta às comunidades indígenas. A declaração de interesse público das linhas de transmissão de energia, porém, ainda precisará ser regulamentada pelo presidente da República, assim como serão feitos os cálculos para a indenização.

Se aprovada no Senado, a proposta seguirá para votação na Câmara.