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Na esteira climática, indústria nuclear retoma crescimento

Na esteira climática, indústria nuclear retoma crescimento

Em: 24/04/2019 às 11:25h por

Com uma agenda vinculada à redução das emissões de gases do efeito estufa, a indústria mundial de energia nuclear pavimenta uma retomada oito anos após o acidente ocorrido na central nuclear de Fukushima, no Japão, atingida por um terremoto seguido por um tsunami. Somente no ano passado, entraram em operação nove reatores nucleares no mundo, sendo dois na Rússia e sete na China, totalizando 10,4 gigawatts (GW) de capacidade. Também foi reiniciada a operação de usinas nucleares no Japão somando outros 5 GW.

A crescente demanda por energia no planeta, principalmente em países emergentes, combinada com a pressão da sociedade por um menor uso de carbono, sobretudo pelos países desenvolvidos, foi o mote da AtomExpo, um dos maiores congressos da indústria nuclear mundial, realizado na última semana em Sochi, na Rússia. Com participantes de 74 países, incluindo o Brasil, o evento também discutiu aplicações nucleares para medicina, transporte e agricultura, entre outras atividades.

"[2018] foi um dos melhores anos da história do setor", afirmou a diretora geral da Associação Nuclear Mundial (WNA, na sigla em inglês), a sueca Agneta Rising, que transitava sorridente pelos corredores com paredes verdes, decoradas com enfeites de natureza, no "Main Media Centre", instalação construída durante os jogos olímpicos de inverno de 2014 e que abrigou o congresso. Para efeito de comparação, em 2017, apenas quatro novos reatores foram adicionados ao sistema elétrico no mundo, com um total de 3,4 GW.

Hoje, há 55 reatores em construção no mundo, incluindo Angra 3, no Brasil. Ao todo, estão em operação 450 reatores (397 GW).

A avaliação geral do evento é que os aspectos de segurança implementados após o acidente em Fukushima (foram revisadas e aperfeiçoadas medidas de segurança em mais de 140 reatores no mundo após o incidente) e a visão da energia nuclear como uma fonte limpa têm possibilitado uma maior aceitação da tecnologia pela opinião pública e, inclusive, por ambientalistas.

Na Finlândia, por exemplo, onde há quatro reatores em operação e um quinto previsto para dar a partida em 2020, o partido verde local mudou sua visão com relação à fonte nuclear no ano passado. Antes contrário à tecnologia, o partido passou a não criticar mais a fonte, devido a uma visão aberta a todas as tecnologias de baixa emissão de gases do efeito estufa.

Outros "verdes" vão além e passaram a apoiar abertamente a energia nuclear. De acordo com o ambientalista Michael Shellenberger, que coordena a organização não-governamental (ONG) californiana Environmental Progress e assumiu posição favorável à energia nuclear, o apoio à fonte tem crescido rapidamente devido à constatação de que as energias renováveis não conseguirão sozinhas descarbonizar significativamente a matriz energética global.

Grandes ONGs ambientalistas, como o Greenpeace e a WWF, porém, mantêm suas posições contrárias à energia nuclear. Para a WWF, a energia nuclear tem custo elevado e os governos deveriam estimular investimentos em projetos de fontes eólica e solar.

Com o apelo climático, a fonte nuclear tem buscado aumentar a penetração na matriz energética global, atualmente inferior a 10%. No Brasil, em tese, esse caminho seria mais complicado, já que as fontes renováveis ocupam parcela considerável da matriz energética (45%) e do parque gerador de energia elétrica (80%).

Para Shellenberger, porém, o governo brasileiro está dando passos positivos para a expansão da oferta de energia nuclear e a descarbonização de sua matriz, assim como França e Suécia fizeram no passado. Na França, a fonte nuclear responde por 75% da matriz elétrica, enquanto no país escandinavo, ela ocupa 50%, a outra metade é preenchida por renováveis.

"Não é preciso acreditar na mudança climática ou se preocupar com ela para saber que a energia nuclear, particularmente combinada com a hidreletricidade, cria energia elétrica barata para impulsionar o crescimento econômico", disse o ambientalista. "França e Suécia são nações ricas em parte pela expansão da energia nuclear", completou.

Com relação à Alemanha, que mantém firme a posição de não apenas não construir novas usinas, mas desativar todas as que possui até 2023, Shellenberger destaca que o país terá que gastar US$ 580 bilhões em solar e eólica e em infraestrutura de energia até 2025, enquanto assiste o custo da eletricidade crescer 50%.

Não é de caráter econômico, no entanto, o maior obstáculo para a energia nuclear. O principal tabu para a indústria ainda é a destinação dos resíduos e o risco de acidentes em usinas.

Para encarar esses temas em fóruns variados, a WNA elaborou uma cartilha. "Queremos iniciar uma discussão séria sobre como a energia nuclear pode contribuir para vida das pessoas", disse Kirill Komarov, primeiro vice-diretor geral da Rosatom para Desenvolvimento Corporativo e Negócios Internacionais e presidente do conselho de administração da WNA.

No caso dos resíduos, por exemplo, a entidade explica que existem instalações para a deposição de resíduos de nível de radiação baixo e intermediário. Para resíduos de alto nível radioativo, são necessários repositórios geológicos profundos. Mas a maioria dos resíduos de alto nível, segundo a WNA, são de combustível usado no reator nuclear e que pode ser reciclado e aproveitado nas usinas atuais, reduzindo a quantidade de material que precisa ser armazenada.

No caso de Fukushima, o gerente geral da Tokyo Electric Power Company (Tepco), Masumi Ishikawa, contou que a última etapa para a retirada do combustível nuclear do local começou neste mês. O trabalho de remoção do combustível nuclear está previsto para ser completamente concluído em 2020.

Sobre a utilização do combustível nuclear para fins não-pacíficos, a WNA defende não haver relação direta entre a geração de energia e a proliferação de armas nucleares. A Coreia do Norte, por exemplo, desenvolveu armas nucleares, mas não possui geração a partir da fonte nuclear, ressaltou a entidade.

A WNA acrescentou que um eventual encerramento de programas nucleares civis não impediria, por exemplo, a disseminação de armamento do tipo. Além disso, salvaguardas da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) e da Organização das Nações Unidas (ONU) fiscalizam constantemente instalações de enriquecimento e reprocessamento de urânio para evitar que elas sejam utilizadas para a produção de armas nucleares.

O evento em Sochi teve ainda outra importância para o Brasil. Projeto desenvolvido pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) e a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) ganhou o prêmio AtomExpo na categoria "Nuclear technologies for better life" (tecnologias nucleares para uma vida melhor). A iniciativa estudou a irradiação de uso contínuo do Cobalto-60 e um acelerador de feixe de elétricos para tratamento de efluentes industriais.

Fonte: Valor Econômico